Controvérsia dos RIFs do Coaf no STF deixa juízes sem saber a quem obedecer

Por Jefferson Freire

A mais recente controvérsia a dividir o Poder Judiciário brasileiro vai além de questões de técnica processual ou de interpretação de precedentes: trata-se de um problema de hierarquia institucional e de confiança entre os tribunais superiores.

A disputa em torno do uso dos Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs) produzidos pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) transformou-se em um verdadeiro labirinto jurídico, no qual juízes, promotores e investigadores não sabem, com clareza, a quem devem obediência.

No dia 25 de agosto, duas decisões opostas ilustraram o cenário de incerteza.

A primeira, divulgada pela Consultor Jurídico, informou que o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), havia validado decisão que anulou o uso de RIFs solicitados por órgãos de investigação sem autorização judicial, reafirmando a necessidade de controle jurisdicional no compartilhamento de dados financeiros.

Poucas horas depois, a mesma publicação noticiou que o ministro Alexandre de Moraes, relator do processo que discute a constitucionalidade dos chamados RIFs “por encomenda”, determinou a suspensão de todas as decisões que consideravam essa prática ilegal.

Moraes entende que a requisição de relatórios pelo Ministério Público ou pela polícia não viola o Tema 990 de repercussão geral, que reconheceu a validade do compartilhamento espontâneo de informações entre órgãos de controle e de persecução penal.

STJ em meio ao fogo cruzado

No Superior Tribunal de Justiça (STJ), a divergência entre as turmas do Supremo causou perplexidade.

Durante sessão da 5ª Turma, em 7 de outubro, o ministro Joel Ilan Paciornik relatou publicamente a confusão instalada entre assessores e magistrados.
“Não sei, porque nesse sistema realmente não sabemos a quem devemos obediência”, afirmou, ao ser questionado sobre qual decisão do Supremo deveria prevalecer.

O episódio expôs o impasse vivido pelo STJ diante da cisão jurisprudencial do STF.

O colegiado fora obrigado a seguir decisão da 1ª Turma (Rcl 70.191), relatada por Alexandre de Moraes, que havia anulado um acórdão anterior da própria 5ª Turma.

Nesse acórdão, o STJ considerara ilícito o uso de RIFs solicitados antes da instauração formal de inquérito policial, por entender que a requisição direta ao Coaf, sem autorização judicial, afronta o princípio da reserva de jurisdição.

O relator do caso, ministro Ribeiro Dantas, chegou a solicitar comunicação ao presidente da 3ª Seção, ministro Antônio Saldanha Palheiro, informando que o aparente descumprimento da jurisprudência interna do tribunal se dera em respeito à decisão superior da 1ª Turma do STF.

“Estamos numa situação muito difícil”, reconheceu Dantas.

“Uma turma do Supremo entende de um jeito, outra entende de outro. Quando decidimos conforme uma delas, a outra reforma. E quando decidimos conforme a outra, a primeira reclama.”

Diante do impasse, Ribeiro Dantas adiantou que o STJ continuará acatando as decisões proferidas em reclamações constitucionais vindas do Supremo.

“Além de disciplinados em relação aos nossos precedentes internos, precisamos ser obedientes à instância maior”, concluiu o ministro.

Fonte: CONJUR